sábado, 30 de janeiro de 2010


CHUTANDO O PAU DA BARRACA

O que merecemos?

Todos nós um dia tivemos (ou ainda vamos ter) vontade de jogar-tudo-pro-alto e sem lenço-nem-documento sair por aí mundo afora, só com a passagem-de-ida.

Quem ainda não teve (ou não assume), deve ter tido pelo menos vontade de sair-de-cena por alguns dias, esconder-se em algum lugar especial e longe das pessoas e preocupações do dia a dia...

Na verdade, é cada vez maior o número de pessoas que de repente sente vontade de abandonar sua rotina monótona, desinteressante ou estressante para dar um salto-no-escuro, mudando radicalmente seu estilo de vida.

Pode ser um intercâmbio na China (país do futuro), uma viagem ao interior da Índia (atrás do seu guru) ou uma jornada latino-americana via Santa Cruz de la Sierra, até os píncaros dos remotos redutos nos confins dos Andes, ou em uma bela mansão no bairro do grajaú do ex-namorado...

Psicologicamente, que é o que nos interessa em nosso espaço, são as motivações clássicas que estimulam o ser humano a alçar vôos enigmáticos e ousados desta natureza...

O best-seller de Elizabeth Gilbert (Comer, rezar e amar), que permaneceu por mais de 40 semanas na top list da revista Veja (no mundo já vendeu 4 milhões de exemplares!), dos mais vendidos, retrata bem a necessidade de se afastar do lugar, do meio e das pessoas que nos feriram, a fim de poder lamber nossos machucados-da-alma e cicatrizá-los lentamente...

O tombo pode ser financeiro, afetivo, orgânico ou espiritual, não importa... Muitas vezes não é tão visível ou mensurável, aparecendo como uma sensação de vazio, de tédio, de incompletude...

Um outro aspecto interessante desta busca é a necessidade de diversificação, de variação, de ter contato com o novo, o desconhecido... Além do aspecto aventureiro em si, traz a possibilidade de descansar-a-mente, de criar novas visualizações para velhos problemas, de re-carregar as baterias mentais!

O mais sutil e profundo fator que promove tal mudança é a necessidade de correr-atrás-dos-nossos-sonhos-mais-recônditos, aqueles ideais e desejos sufocados pela necessidade de sobreviver e trabalhar norteados por um padrão de consumo muitas vezes questionáveis. São sonhos adiados, desejos reprimidos, idéias acalentadas que de repente acordam dentro de nós, como um vulcão incansável a exigir respostas...

Para mim, uma grande reflexão disso tudo dispara na direção do que realmente acreditamos que merecemos...

Nossa educação e formação católico-ibérica, que preconiza o velho fantasma da culpa e da vergonha, nos ensinaram inconscientemente que não devemos ceder e/ou satisfazer nossos reais desejos e prazeres sem remorso... Aí nos iludimos com conquistas materiais, realizações profissionais e afirmações sociais, nos protegendo das tentações...

Um dia a vida pede conta de todo este seqüestro psicológico e emocional.

Se pra você esta hora chegou, ponha o pé na estrada e diga apenas: VOU ALI E JÁ VOLTO (OU NÂO). BJKS DA VANN


domingo, 17 de janeiro de 2010

ONLINE

Hoje em dia, com o desenvolvimento da informática, da eletrônica, das telecomunicações e, principalmente com o avanço da tecnologia digital, todo mundo de alguma forma procura se inserir neste universo, na tentativa de acompanhar sua evolução, beneficiar-se de suas maravilhas e fugir ao máximo do fantasma da “exclusão”, de si tornar um dinossauro moderno, um analfabeto cibernético!

Além do mais é moda, é prático, é amigável e é cada vez mais acessível a todas as camadas sociais, especialmente à dos mais jovens, cada vez mais “enlouquecidos” com as novidades do mercado!

Então é “um tal de trocar o chip”, buscar uma nova promoção, mudar de operadora, atualizar o modelo do celular, incorporar novas tecnologias, tudo em nome do prazer, da vaidade, da comodidade, por que não da necessidade, e até da ostentação!

É tanta a preocupação em estar conectada, digitalizada, informatizada, “plugada”, que tais instrumentos (lap top, celular, Mp4, 5,6...) estão se tornando indispensáveis e essenciais para o “funcionamento” do cotidiano de cada um!

Nada contra isso, ou à inevitável evolução tecnológica...

O que questiono é que esses aparelhos são meros, ainda que avançadas, ferramentas, meros dispositivos, ainda que “inteligentes”, de comunicação, de transmissão de dados, meros mecanismos, ainda que fascinantes, de melhorar nossa acessibilidade, nosso lazer, nosso trabalho, nossa qualidade de vida...

O perigo começa quando me identifico em demasia com ele, quando me deixo envolver a ponto de não conseguir mais me “desgrudar” dele, quando no limite do exagero quase “entrego” minha vida a ele, quando passam a assumir todo o controle, a consumir todo o nosso tempo, a “sugar” toda a nossa energia e criatividade...

Nestes casos limites substituem o poder da vontade pessoal, pelos caprichos de uma “rede” mundial, que pouco a pouco se transforma no novo “inconsciente-coletivo- online”, deixando-nos totalmente à mercê dos interesses e ideologias duvidosas, que nutrem e alimentam todo esse sistema, sabidamente comprometido com os ideais e lógicas do consumo capitalista, que norteia toda a filosofia ocidental do poder, egoísmo e competição desenfreada!

Se canalizássemos todo este interesse, toda esta energia, toda esta volúpia para nos beneficiarmos psicologicamente, aprendendo e usando todo este “conceito” e aparato tecnológico, aplicando-o às leis universais que controlam o planeta, os relacionamentos, as emoções, enfim no que realmente pode exercer poder e influencia direta e positiva em nossa vida, certamente que o resultado seria compensador...

Poucos de nós talvez no fundo saibam que é a nossa mente subconsciente (aquela que é obediente, que armazena todos os nossos arquivos), a responsável por captar todas as mensagens (boas ou ruins) do ambiente, dos outros, do astral, do “inconsciente coletivo”...

É ela que funciona com base na “lei da atração”, o grande segredo conhecido e praticado em profusão pelos grandes mestres em seu benefício e da comunidade!

Dependendo de nossa programação interna, dependendo do tipo de “chip” instalado em sua mente subconsciente, vamos ter a tendência de “absorver” mais coisas negativas ou positivas...

Ambos, o bem e o mal, existem o tempo todo, e estão disponíveis à cata de novos usuários...

É só escolher no menu, é só apertar a tecla certa (ou errada), é só digitar a senha correta ou não, é só conectar o sinal correspondente...

É por isso que dizemos que “a água só corre para o mar” ou ao contrário, que “desgraça pouca é besteira”...

De que lado você quer ficar?

Para qual margem você quer empurrar seu barco?

Quer continuar sendo “espancado” pela vida, ou passar a velejar num mar de rosas?

Que tal examinar seu “chip” mental?

Que tal jogar fora antigas fitas velhas e substituí-las por novas, digitais, capazes de atraírem tudo o que você sempre sonhou realizar?

Faça já um “up-grade” psicotecnológico em suas crenças, jogue pra fora todos os “circuitos” de medo, de angústia, de doença, de culpa e de rancor para a “lixeira universal”, e delete todos os sinais e contatos com o mundo do sofrimento, da humilhação, do desemprego, da carência, da impossibilidade!

Dê um basta nos “blogs” da paralisia, nos “twitters” da vaidade, nos “MSN’s” do egoísmo, e renove sua memória, “escaneie” um novo modelo, digite um novo e-mail ao Todo Poderoso, onde possa realmente depositar todas as suas esperanças, sonhos e desejos que deseja ser concretizados em 2010, 2011, 2012...!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

AMOR NOS OLHOS DO OUTRO

O que há por trás do amor?



“O que uma pessoa mais quer, quando diz amar alguém, é se ver nos olhos do outro”

Falar de amor até parece clichê visto que este é um assunto que sempre está em pauta desde que o mundo é mundo e sempre ganha espaço na mídia, seja nas telenovelas, seja nos noticiários que nos assombram com inúmeros crimes passionais. Neste exemplo, estamos falando de dois extremos de um mesmo tema: pessoas que morrem de amor e pessoas que matam por amor. Mas a questão central que muitos buscam entender é o porquê de muitas pessoas perderem o equilíbrio e não conseguirem cultivar um sentimento saudável nos relacionamentos amorosos.

A resposta pode estar mais perto do que imaginamos. Nossos comportamentos e sentimentos têm muita relação com a nossa personalidade e com os sentimentos que nutrimos por nós mesmos. O ser humano é egocêntrico e narcisista por natureza. Nesse sentido, pode-se dizer que todos estão à procura de admiração e consideração, até mesmo aqueles que parecem depreciar-se. Sob essa perspectiva, podemos dizer que amar uma outra pessoa significa amar aos nossos próprios ideais e características projetadas na outra pessoa, ou seja, o que uma pessoa mais quer, quando diz amar alguém, é se ver nos olhos do outro. É poético, mas é uma grande verdade.

O ser humano age assim inconscientemente, no entanto, isso é um convite à decepção nos relacionamentos, pois atribuímos muitas expectativas às pessoas acreditando que elas vão nos corresponder e nem sempre elas podem ou desejam corresponder às nossas expectativas. Tal fato também explica por que tantos casais se irritam ou tentam mudar o jeito de ser de seus companheiros. As pessoas tentam encaixar “o ser amado” em suas próprias formas de companheiros ideais, e deixam de perceber o outro como ele realmente é. Afinal, se o amor não fosse egoísta seria tão mais fácil aceitar os defeitos daquele a quem se diz amar, e, com certeza, acabariam muitos os motivos de brigas entre os casais.

Uma razão para que isso aconteça é que as pessoas não estão acostumadas a olhar para dentro de si. Costumamos perceber mais facilmente nossas qualidades, mas, quando o assunto são nossas fraquezas, defeitos, necessidades e limitações, tendemos a negar, fugir ou até mesmo evitar o contato pra não ferir o nosso ego. É mais fácil olhar para fora do que para dentro de nós mesmos. Esse comportamento dificulta que desenvolvamos o nosso amor-próprio e muitos passam a colocar-se em segundo plano, priorizando àquele a quem se direciona todas as energias e sentimentos.

Um grande problema surge quando esse quadro se instala. A frustração, quando mal compreendida e elaborada, pode levar à melancolia, à depressão e até mesmo a respostas agressivas de dimensões diversas, até extremas. E o tipo de reação nestes casos também depende de como a pessoa está fortalecida emocionalmente, principalmente quanto à imagem que tem de si.
Se pudéssemos compreender o amor tal como ele é: tão simples em sua complexidade, quem sabe poderíamos controlar algumas de nossas respostas à dor que, por vezes, acompanha esse sentimento. Assim, entenderíamos que, enquanto as pessoas se desgastam procurando por um amor, estão na verdade buscando encontrar a si mesmos no outro.
BJKS DA VAN

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

EU ME RENDO

Desisto, entrego os pontos. Não escrevo mais amenidades, textos do cotidiano onde buscava sempre o belo, o engraçado, o entretenimento. O alegrar, o arrancar risada, mas sempre levando a alguma reflexão sobre o passar das horas da vida de quem por acaso as lia. Pelo visto, sentida e observada, não anda fazendo bem ser bem-humorada e tentar dividir observações, digamos, inúteis.

Àqueles que muitas e muitas vezes me escreveram, telefonaram ou quando me encontravam, sorrindo compartilhavam alegres de minha forma de registrar a história, peço desculpas. Aos resolvidos, sem perderem a lucidez, o senso crítico e sensibilidade, peço penico, me rendo, jogo a toalha.

Acho que chegou a hora de, como o quibe, me tornar ácida. Joguei a toalha e desci do salto. Parei de brincar.

As pessoas andam ávidas por más notícias, por tragédias, por tristezas. Escondem ou descontam nos acontecimentos o seu próprio sofrer, sua própria indignação e revolta com o que a vida anda a lhes oferecer. Uma forma de compensação, vingança ou triunfo sobre suas existências. Ninguém mais quer rir de si mesmo, nem buscar nas paisagens de seu cotidiano o céu azul, o ipê florido ou a criança sorrindo inocente. É mais fácil e confortante/compensador ver o funesto, o triste. Acompanhar as estatísticas dos acidentes e mortes nas estradas em decorrência dos fins de semana prolongados, a contagem de crimes violentos, os assassinatos em nossos bairros, à nossa porta. Ninguém quer mais o próprio sofrimento e angústias, preferem a dor e o desconforto alheio.

Mas, mesmo assim, ainda me espanto. Ano passado as festas de fim de ano já se anunciavam, e assim, em breve, bem hipocritamente, todos passam a se fazer de felizes e desejar tudo de bom ao próximo. Falsa felicidade, placebo para angústias das vidas. Não se iludam, passou o Réveillon, com o chegar das contas e faturas do cartão de crédito, usado na euforia de um comprar ser feliz, as faces novamente se fecham e novamente passamos a concentrar nossas atenções nas más notícias sazonais. Pois aberta estará a temporada de dengue, enchentes, quedas de barreiras, Pode ser que eu volte ao normal. Mas hoje não estou para carnaval baiano.

Afinal, como disse os mineiro da velha piada, quando perguntado se gostava de nudez: Uai, é claro que gosto! “Nudeis” é melhor do que nosso uai sô.”

Até mais ver. Volto a qualquer momento em edição extraordinária, caso no meu bairro Vila Isabel não acontecer outro acerto de contas entre traficantes do morro dos macacos x são joão(na Barão do bom retiro x faixa de gasa com fronteira para o inferno) ou mais, um político corrupto for filmado recebendo suborno. Ou, quem sabe, um laboratório farmacêutico superfature medicamentos para o SUS, um supermercado que adultera data de validade de tortas de camarão ou, ainda, a nova gripe venha fazer novas vítimas. E mesmo havendo um renovar-se de esperanças, eu me torno, só hoje, em uma grande espírito de porco.

bjks da Vann

FELICIDADE SER FELIZ

23/12/2009 - 15h14m

Nosso passado costuma ser uma zona de sombra e indefinições. Que pode retornar, de forma súbita e inesperada, tal qual uma incômoda pergunta que ficou sem resposta, ou uma indecisão à qual não se deu forma ou solução. Todo passado é uma caixa lacrada, pedindo para ser aberta, vasculhada, reorganizada. O conteúdo que pesa no passado é a dor, daí o seu empenho em ser aberto, pois há que trazer de volta ao presente o impacto dos traumas vividos e mal elaborados.

Seres atravessados pela angústia, por um passado que oprime, uma pergunta nos ocorre com frequência: o que esperar do amanhã?

E a ideia de felicidade nos acode, pois todos nós ansiamos por ela, como algo que nos pertence por legítimo direito. Contudo, por mais que se busque a felicidade, sinônimo de luz e harmonia, a escuridão continua central em nossa vida – carregamo-la dentro de nós mesmos, na forma de vazio, de vertigem, de pecado original. Muitas vezes, a sensação, difícil, é a de que se chegou à borda, e qualquer passo em falso redundará na queda inexorável: Nada sabemos, a não ser que há uma noite / pura e vazia à nossa espera. Uma noite intocável / além do fogo e do gelo, e de qualquer esperança (Lêdo Ivo).

Todavia, a aventura pessoal, a busca da elaboração dos traumas que nos afligem e sufocam, pode ser extremamente excitante, ainda que desconfortável e dolorosa. A aventura pessoal nos confronta com o teatro do absurdo que é a vida – Os homens morrem e não são felizes. Apegados desesperadamente a uma carne que definha, a um Deus que não existe, entregamo-nos à tarefa de acumular: teres, haveres e atos de crueldade gratuita e arbitrária. Quando não nos arvoramos pela sede de poder em imitações baratas de Deus, um Deus feito à nossa imagem e semelhança.

Não sei quase nada sobre isso, mas acho que aqui nos defrontamos com a psicanálise. Acho que ela pode nos ajudar a resgatar e elaborar o passado traumático, a compreender as novidades que a civilização nos impõe, incluindo a moda, atual e recorrente, de medicalização da existência. A psicanálise, enquanto um discurso de crise, ajuda-nos a refletir sobre a vida e os impasses da existência. Ela nos acena com a cura – a cura enquanto a mencionada e inédita aventura pessoal. E no bojo da psicanálise, nela se sustentando, o discurso literário pode ajudar-nos a mergulhar fundamente na experiência individual, resultante do confronto do eu com o mundo, com o passado traumático, com a banalidade e a transitoriedade da vida.

Com os poetas e a poesia aprendemos a conferir um estatuto singular, quase sublime, ao que é trivial, doméstico, tangível, pois, com palavras cotidianas, os poetas dizem coisas agudas. E, de repente, até a morte pode ser redefinida: de um estado transitório que dá acesso à imortalidade, a morte pode definir-se, antes, pelo seu mistério, pela incerteza que a cerca, pelo silêncio tumular de que se reveste. E então, rendemo-nos à evidência: nossa condição humana não encontra nenhuma explicação final capaz de convencer. O mistério da existência transcende qualquer postulado da razão humana.

Seres de fronteira, habitantes do limite, só nos resta repetir com Nietszche: É preciso ultrapassar o homem, curá-lo de seu grande cansaço. Diante da crueza do real, não basta refugiar-se nos ideais criados, nas quimeras ou nos sonhos delirantes. Há que se proceder à efetuação profunda da própria vontade. Há que se reinventar.

E PRECISO AVANÇAR MESMO AOS TROPEÇO

A vida é cheia de acontecimentos ininteligíveis, o que nos leva, não raro, a mergulhar fundo no universo do desencanto. É aí que surgem os poetas, com o seu manejo singular das palavras. Porque as palavras, já o afirmara Sartre, não se limitam a ser instrumentos práticos de comunicação. O poder da palavra decorre da sua possibilidade de transfigurar o mundo, mais do que oprimi-lo. O poeta é um homem perplexo que nos faz olhar o mundo e a realidade de forma mais apurada, mais crítica.

O poeta (leia-se o escritor) não se limita a nos mostrar as coisas, ele nos faz vê-las. Por isso, poetas e escritores são devoradores de textos, o que os torna capazes de desconfiar das fantasias e de certas teorias propagadas pelos livros. Daniel Piza, articulista de O Estado de S. Paulo, nos adverte: a literatura não foi feita para tomar o lugar da vida, da experiência real, mas para iluminá-las (vida e experiência real). E cita o ensaísta russo Tzvetan Todorov, que afirmou: "a literatura permite que cada um responda melhor à sua vocação de ser humano".

Para Todorov, a ficção se aproxima da ciência, complementando-a, enquanto instrumento de interpretação da realidade, da natureza humana. Por isso, o autor não tolera a ideia, assente entre certos professores e certos críticos, de uma análise da literatura desconectada da vida, dos grandes temas da condição humana, uma análise da literatura que ignora o contexto humano, reduzindo-a apenas a jogos de linguagem. A matéria da literatura é a carnalidade do cotidiano das pessoas. É inegável o fato de que muitos livros nasceram da necessidade brutal de se entender uma perda irreparável, um amor extremo ou a inevitável finitude. A escrita ajuda-nos a suportar a realidade, a atravessar experiências difíceis, a solidão, o vazio, a morte.

Portanto, a escrita e a imaginação têm um poder maiúsculo. Daí decorre o grande interesse dos regimes autoritários em obrigar-nos a ignorar, a só conhecer o que desejam que conheçamos. A literatura nos incita a burlar os regimes de exceção, a ler sem medo das consequências, a ler como quem caminha sobre uma corda bamba, sem cair, sem medo de avançar. O filósofo Marcuse já dizia: a arte não pode ser um espaço de prazer confinado no interior do indivíduo. A arte não pode servir apenas de remédio, de alívio ao cotidiano opressor, de manipulação das consciências. A literatura, portanto, não pode ser apenas um consolo nesse mundo mergulhado na agonia, na perplexidade, na barbárie, travestida de civilização.

É certo que a escritura não esgota o real. Nem tampouco a ciência o faz. Haverá sempre um hiato entre o que se busca e o que se encontra. Mas o escritor, no seu ato solitário de escrever, ensaia pequenas verdades, provisórias, envoltas sempre em zonas de sombra, que o desafiam a prosseguir sempre. Inúmeras são, portanto, as funções da escrita. Freud, que manteve com o amigo Wilhelm Fliess uma correspondência de longos anos, fez de sua escrita uma estratégia de investigação, que resultou na construção da teoria psicanalítica.

É isso, leitor amigo. Abramos espaço em nossas vidas à literatura, à sensibilidade. Concentremo-nos em perseguir o que é grandioso, o que nos transcende, o que nos faz avançar, ainda que aos tropeções. Com Lygia Fagundes Telles, acreditemos na permanência da palavra escrita, que é a negação da própria morte.

BJKS DA VANN

VIVER A VIDA

“Vida louca vida, vida breve...” (Bernardo Vilhena/Lobão)

A ideia de que a vida é frágil demais nos assusta a cada instante!

Remete-nos à reflexão importante sobre o modo de ser do homem contemporâneo. Este homem que trabalha, trabalha e trabalha e que nunca se encontra realizado profissionalmente, vivendo em uma busca constante, em sua trajetória profissional e pessoal. Cada vez mais vivemos numa sociedade da técnica, sociedade esta, digitalizada, em que tudo parece previsível, passível de transformação numérica. E é justamente no íntimo dessa convicção sobre o exato, que o inesperado faz sua intromissão devastadora, deixando marcas na história da humanidade. Na forma brutal, de um acidente fatal, onde a morte aproxima-se no recôndito do corpo de pessoas que estavam em um avião, que se abate sobre um edifício, causando-nos tamanha perplexidade e um sentimento enorme de impotência.

O desenvolvimento científico dos últimos anos, em progressão geométrica, tem criado condições para uma vida saudável e uma idade avançada, um prolongamento da expectativa de vida que não conhecíamos há alguns poucos decênios passados. Somos com isso induzidos a uma segurança absoluta. O transitório torna-se permanente até que o inesperado acontece e leva-nos a ter uma nova concepção de vida. O tempo tem nova dimensão na velocidade dos acontecimentos que passam por nós numa sucessão ininterrupta, tudo reduzindo ao instante presente como se fosse eterno. Os dias não têm fim com o por do sol, prolongando-se pelas noites que se estendem até o raiar do sol.

No entanto, apesar de tudo isso, é terrível constatar que a vida humana é muito frágil. Nossos dias passam velozes. Não nos adianta toda a segurança do mundo, toda a riqueza e poder. Estamos sujeitos sempre aos incômodos, incluindo-se as doenças e a morte. Portanto, devemos viver nossos dias com sabedoria, pois, a vida é uma só, uma única e poderosa oportunidade para realizarmos projetos grandiosos e enobrecedores, capazes de produzir efeitos enriquecedores nos outros e principalmente em nós mesmos.

Para isso, olhe ao seu redor, perceba o reflexo que causa nos demais, perceba como se sente perante os mesmos e todos os dias perante você próprio. Faça uma auto-análise de como está vivendo.

O que me fez ficar pensando hoje foi o fato de a vida ser tão frágil. Em um momento estamos aqui bem, e em outro, em um piscar de olhos, não estamos mais. Tal fato contribuiu e muito para que eu refletisse e decidisse a viver cada momento, aproveitar cada oportunidade, ficar junto de quem gosto o máximo de tempo possível. Sei que é difícil, mas acho que tenho que parar de esperar que as coisas melhorem, que o trabalho diminua, que eu tenha mais dinheiro, que eu encontre um grande amor para aproveitar o que a vida está me oferecendo agora.

Não sei se estarei aqui daqui a um dia, daqui a um mês, daqui a um ano. Estarei aqui o tempo que me for permitido e quero que esse seja o melhor tempo de todos.

BJKS DA VANN