sábado, 13 de setembro de 2008

como vivem os poetas

Gente, vocês já repararam ou sentiram como os poetas vivem? A poesia, para eles, é uma forma especial de intensificar nossa relação com o mundo, com o outro, com as grandes questões da existência, pois a poesia atende a nossa necessidade de sonhar. Ela nos conforta e nos ajuda a aceitar nossa finitude. A força da imaginação poética transforma nossa realidade simples e prosaica em realidade sonhada, transfigurada, oferecendo-nos, gratuitamente, um caminho para a transcendência.

A escrita poética é o alter ego do poeta que, exprimindo-se, fala de regiões desconhecidas de si mesmo. Ao conceber seus versos, o poeta expõe a sua (e a nossa) precariedade. Na sua ânsia angustiada de comunicação, o poeta partilha conosco sua substância existencial como quem partilha um pão com quem também tem fome.

O poeta é aquele que encontra grandeza naquilo que não se deixa ver, tal como as existências comuns, as coisas mínimas, os objetos desprezados: Bom era / ser como o junco / no chão: seco e oco / cheio de areia, de formiga, de sono... (Manoel de Barros). A única grande intenção do poeta é o retorno ao imediato, ao aqui-e-agora, que o faz movimentar-se, não por suas convicções já estabelecidas, mas pelas pulsões inconscientes, cujo sentido ainda lhe escapa e que o conduzem a direções, quase sempre, imprevistas.

Como afirma Nélida Piñon, a grande luta do escritor é arrancar toda a multiplicidade que existe no verbo, sem nunca conseguir esgotá-la. Seu empenho maior é suspender o descaso do leitor, num processo semelhante ao da sedução. Trata-se de atrair o leitor para a poesia: esse banquete da inventividade humana que nos é prodigamente oferecido, de geração a geração, pois um poeta e seu poema nunca morrem por completo. Algo da qualidade luminosa de um e de outro permanecem.

Quando escreve, o poeta não está só, mas acompanhado de seus próprios fantasmas, repleto de medo, solidão, ansiedade, sentimentos que também são nossos, independentemente dos rótulos identitários que carreguemos. Ocupar-se da escrita literária é dizer sim a uma exigência interna, que implica também colocar-se sob o olhar de outros e que também pode levar a saltos silenciosos de alegria. Parodiando o poeta Nelson Capucho, diríamos que poemas são aquarelas tipográficas, são flores estranhas que um jardineiro maluco rega e aduba sem saber a grande importância que têm e quanto bem fazem.

O poeta está interessado, sobretudo, na vida, em colocar a vida nos versos de seus poemas, pois o poema é arte, beleza, verdade. Mas ele nos ajuda também a lidar com esse algo devastador e impensável que é a morte e o morrer. À literatura, especialmente à poesia, cabe ocupar o espaço infinito que se abre entre o silêncio e a exigência do dizer. Mas, ainda quando fala da morte, a poesia, em última instância, reafirma a necessidade imperiosa da vida, do existir, tal como os belos versos do poeta espanhol, Juan Ramón Jiménez: eu partirei, mas os pássaros ficarão...cantando! Porque poesia é voar fora da asa, diria o grande poeta Manoel de Barros.

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